Características do Processo de Tomada de Decisão
José Roberto Goldim

Existem inúmeros modelos para o processo de tomada de decisão. Francisco Araújo Santos, baseando-se no pensamento de Max Weber, propôs um que é extremamente útil na área da Bioética.

Segundo este modelo, as evidências externas ao indivíduo são percebidas através de um "filtro" de crenças. Este mesmo indivíduo tem desejos, que alteram as próprias evidências, de acordo com as expectativas de cada um. As evidências filtradas e alteradas por estes dois sub-sistemas desencadeiam a seleção de alternativas, que servirão de base para a tomada de decisão e conseqüente ação que o indivíduo irá realizar.

Este modelo permite evidenciar que  frente às mesmas evidências diferentes ações podem ser propostas  por diferentes indivíduos. Estas diferenças podem estabelecer conflitos de autonomia na relação entre um profissional e seu paciente, ou entre familiares de uma paciente. O profissional deve estar atento para identificar as diferentes crenças e desejos, ou expectativas envolvidas, e buscar encontrar soluções que harmonizem estas diferentes perspectivas. A pior alternativa é desconsiderar ou tentar impor um sistema de crenças pessoais para as outras pessoas envolvidas.

O processo de tomada de decisão também pode ter três outras características: envolvimento, reversibilidade e realimentação.

Envolvimento

O processo de tomada de decisão pode ser classificado como sendo de baixo, médio e alto envolvimento.
Tomada de Decisão de Baixo Envolvimento
A tomada de decisão de baixo envolvimento ocorre quando o médico assistente ou outro profissional responsável pela condução do processo decide sozinho, sem consultar qualquer outra pessoa relacionada a situação, inclusive o paciente. Este processo pode ser adequado em situações de atendimentos de urgência, com risco de morte iminente associado. Outra situação possível é quando o médico assistente ou o profissional responsável opta por uma alternativa entre diferentes abordagens possíveis, enquanto que a equipe, o paciente ou seus familiares se dividem entre duas ou mais opções.


Tomada de Decisão de Médio Envolvimento

No processo de tomada de decisão de médio envolvimento o médico assistente ou profissional responsável compartilham suas opções com o paciente e outros membros da equipe ou familiares, preservando a sua autoridade técnica. A decisão é tomada pelo profissional levando em conta as opiniões, restrições e questões levantadas durante a discussão com os demais envolvidos. É o processo de tomada de decisão adequado a situações usuais de atendimento em saúde, onde o paciente participa ativamente mas não existe a perda do reconhecimento da autoridade do profissional. O paciente busca o atendimento justamente por reconhecer no profissional uma autoridade capacitada para auxiliá-lo a lidar com um problema que lhe está afligindo.


Tomada de Decisão de Alto Envolvimento

O processo de tomada de decisão de alto envolvimento é aquele que ocorre quando todos os envolvidos participam de forma ativa e democrática. O médico assistente ou outro profissional responsável estabelece os parâmetros, mas a responsabilidade pela decisão é compartilhada entre todos os envolvidos. O ideal é quando a decisão é tomada por consenso. Este processo pode ser útil no estabelecimento de alternativas de tratamentos de longo prazo ou em situações limites, onde o paciente ou seus familiares, quando este está incapacitado para tomar decisões, solicitam a interrupção ou a não adoção de novas medidas.
Reversibilidade
O processo de tomada de decisão também pode ser classificado quanto a reversibilidade ou não das opções disponíveis. Muitas vezes os profissionais de saúde se deparam com situações onde a tomada de decisão é irreversível, como por exemplo, atender ou não uma solicitação de parada cardiorrespiratória. A opção por não atender tem caráter irreversível. A opção terapêutica por uma medicação é, na maioria das vezes uma decisão reversível, pois conforme o resultado obtido a mesma pode ser mantida ou alterada por outra.
Realimentação
Outra característica é a possibilidade de realimentação do próprio processo de tomada de decisão, permitindo que o mesmo seja subdividido em etapas ou não. Muitas vezes uma decisão implica em executar um processo ininterrupto, sem a possibilidade de correções durante a sua execução. Nesta abordagem não existe a possibilidade de realimentação, isto é, as ações tomadas não influenciam as seguintes. Outras vezes, ao contrário, as decisões podem ir sendo tomadas etapa por etapa, sendo os resultados reavaliados e incorporados ao próprio processo de tomada decisão atual e futura.


Heller R. Como tomar decisões. São Paulo: Publifolha, 1998:17,23.
Araújo Santos F. A malha técnico-científica. Porto Alegre: UFRGS, 1998.

Weber M.Economy and Society: an outline of interpretive sociology. Berkeley: University of California, 1978 (1914):1:26-28.

Modelos explicativos utilizados em Bioética
Bioética: Origens e Complexidade
Textos - Conceitos Fundamentais
Modelos de Relação Médico-Paciente
Página de Abertura - Bioética

Texto incluído em 07/09/1999 e alterado em 06/05/2007
(C)Goldim/1999-2007