Desde 1988, há um paradoxo no federalismo brasileiro. Todos os municípios transformaram-se em entes federativos, com status similar aos estados e à União. Essa autonomia, no entanto, foi instituída num cenário em que a imensa maioria das municipalidades não tinha todas as condições para exercer esse novo poder político-administrativo. Assim, além das enormes heterogeneidades que caracterizam o país em relação à geografia, à demografia e à desigualdade econômica e social, o maior desafio federativo está no seguinte fato: a Constituição e as leis subsequentes repassaram autonomia e a responsabilidade pela implementação de boa parte das políticas sociais no plano local, só́ que a maioria dos governos municipais tem baixa capacidade administrativa e gerencial para realizar essa tarefa. 

O pressuposto de que a descentralização de políticas viria associada com mais democracia no plano local fundamentou esse novo status federativo municipal. Ademais, ampliaram-se as fontes próprias de arrecadação tributária em nível local. Contudo, uma questão-chave nessa engenharia institucional reside na baixa capacidade administrativa local. No entanto, a descentralização gerou como efeito a necessidade de os municípios desenvolverem suas capacidades estatais à medida que as atribuições continuaram a ser assumidas localmente. Nas últimas três décadas, os municípios tornaram-se a unidade federativa central para a qual direciona-se a implementação e a provisão das políticas públicas, sobretudo as de bem-estar. Coube aos municípios assumirem a tarefa de ampliar o acesso a direitos sociais consagrados na Constituição Federal, demandas que se acentuaram sobremaneira com a crise fiscal vivida pelos entes públicos, sobretudo os estados, e com os altos índices de desemprego, elevando a pressão sobre a oferta de bens e serviços públicos pelas municipalidades. As novas atribuições vieram seguidas da garantia constitucional da autonomia política, administrativa e financeira, o que também demanda capacidade estatal para ser exercida.

Nesse contexto, ampliaram-se as exigências por qualificar sua gestão para responder aos seus novos papéis e responsabilidades no plano local e nas relações intergovernamentais. Ao mesmo tempo, pouco se conhece sobre como as administrações municipais estão organizadas, pois as exigências para capacitá-las e qualificar sua ação têm sido um dos mais difíceis obstáculos para a implementação de políticas públicas nas diversas regiões do país. 

A despeito de a literatura nacional em ciência política e administração pública já ter se debruçado sobre esse tema e produzido peças importantes sobre a gestão pública municipal, é preciso atualizar e ampliar o entendimento sobre o tema. Nesse sentido, esta obra visa a contribuir para adensar o debate sobre as capacidades estatais dos governos municipais nos marcos da descentralização de políticas, notadamente aquelas de bem-estar, marca central do federalismo brasileiro após 1988. Uma publicação com essa característica cumpre também um papel didático que é o de prover para cursos de graduação e pós-graduação com uma análise multidimensional e longitudinal sobre o tema. Ademais, busca-se, por essa mesma via, contribuir para ampliar essa agenda de pesquisa na comunidade acadêmica e universitária.

Para tanto, em termos de enquadramento teórico, capacidade estatal é abordada considerando duas grandes dimensões: a) técnico-administrativa: eficiência organizacional para executar funções essenciais como provisão de serviços e habilidades existentes para formular e gerir políticas públicas; b) político-institucional: instrumentos de políticas públicas que garantem a gestão do território e condicionam o comportamento de atores sociais e recursos para desenvolver canais de mediação de conflitos e interação com a sociedade e em nível intergovernamental.



Autor: Eduardo José Grin (FGV/São Paulo), Diogo Joel Demarco (UFRGS) e Fernando Luiz Abrucio (eds.)
Ano: 2021
Tipo de Publicação: Livro


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