Fósseis

O termo fóssil é proveniente do latim fossilis, que significa “tirado da terra”. Fósseis podem ser definidos como restos ou vestígios de seres vivos que habitaram o planeta Terra no passado e são o objeto de estudo da Paleontologia. É através deles que torna-se possível obter informações a respeito dos seres que viveram em um período de tempo geológico anterior ao atual, sendo importantes para o entendimento da evolução da vida através do tempo.

Os fósseis são encontrados nas rochas sedimentares, rochas formadas a partir de sedimentos (fragmentos de outras rochas) que são transportados através de agentes como vento e rios e se depositam em um determinado local. Portanto, a gênese de um fóssil está, muitas vezes, diretamente relacionada à gênese da rocha sedimentar a qual está incorporado. É na rocha que estão as informações sobre o ambiente habitado pelo ser vivo ou, no caso de ter havido transporte do material biológico, o ambiente em que foi soterrado.

Diversos grupos de seres vivos estão representados no registro fossilífero, de modo que a variedade dos materiais encontrados é muito grande, existindo desde grandes mamíferos e gigantescos dinossauros, até polens e esporos de plantas que só conseguimos observar através de microscópios. Comumente associamos os fósseis a imagens de grandes ossadas de dinossauros, mas esta é somente uma fração do registro dos seres do passado. É possível acharmos fósseis de ossos, troncos, folhas, carapaças, conchas, pegadas, tocas, ovos, fezes, impressões de pele, etc.

Fóssil de pegada de dinossauro terópode do Jurássico do Rio Grande do Sul. Foto por Arielle Both Gazzana, 2019.

Fóssil do peixe Dastilbe, proveniente do Cretáceo do Ceará. Foto por Arielle Both Gazzana, 2019.
Fóssil de dente do mamute Elephas primigenius, do Pleistoceno da Inglaterra. Foto por Arielle Both Gazzana, 2019.

Fósseis de ossos, troncos e folhas são classificados como restos (ou somatofósseis), visto que representam a preservação de partes do corpo do próprio organismo. Já pegadas, fezes, tocas e trilhas são classificados como vestígios (ou icnofósseis), estruturas resultantes da atividade em vida de um organismo que modifica o substrato e é preservada no registro fossilífero.

O processo pelo qual os restos e vestígios dos organismos são preservados nas rochas é chamado de fossilização, um evento extremamente raro, visto que a maior parte dos seres vivos acaba sendo decomposta após sua morte, impossibilitando a preservação de seus restos. Muitos dos vestígios deixados por estes organismos são destruídos pelo intemperismo, pela erosão ou pela ação biológica de outros organismos. Ainda, mesmo que um organismo seja fossilizado, durante o curso de milhões de anos é possível que este seja exposto e erodido antes que seja encontrado, isto é, destruído antes mesmo de tomarmos ciência de sua existência. Portanto, os fósseis são materiais raros que representam uma porção limitada do que foi a realidade da biodiversidade no passado geológico.

A fossilização é um processo que varia de acordo com o tipo de material fossilizado, as características do sedimento ao qual é incorporado e ao tipo de ambiente em que ocorre. Alguns dos tipos de fossilização existentes são:

  • Permineralização: ocorre quando partes duras de um organismo, como troncos de árvores e esqueletos ósseos, têm seus poros e cavidades preenchidos por sedimento e substâncias minerais como sílica e carbonato de cálcio, transportados pela água.
Crânio de Jachaleria candelariensis que apresenta permineralização. Uma das consequências deste processo é o aumento no volume do material. Foto por Arielle Both Gazzana, 2019.
  • Substituição: processo em que a constituição mineralógica de estruturas como conchas, ossos e dentes modifica-se através da dissolução do mineral original e a substituição concomitante por outro abundante no meio. O mineral original pode ser substituído por minerais como sílica, pirita, carbonatos e limonita.
Fóssil de concha de Australospirifer, braquiópode do Devoniano de Ponta Grossa, Paraná. Foto por Cristina Silveira Vega.

  • Recristalização: é quando ocorre o rearranjo da estrutura cristalina de minerais instáveis de partes duras de um organismo, que se modificam para formas mais estáveis, dando origem a outros minerais, mantendo a mesma composição química. Como exemplo, temos a conversão da aragonita das conchas de moluscos para calcita. Na recristalização as estruturas mais finas da morfologia dos restos é perdida.
  • Carbonificação ou Incarbonização: é quando há a eliminação de elementos voláteis da matéria orgânica, como hidrogênio, oxigênio e nitrogênio, preservando o carbono original. Ocorre em restos que não foram totalmente decompostos quando soterrados e é comum em fósseis de vegetais.
Fósseis de folhas de Glossopteris preservadas por carbonificação. Neste processo o material apresenta uma coloração escura devido a uma fina película carbonosa. Foto por Arielle Both Gazzana, 2019.
  • Incrustação: é quando minerais carregados pela água precipitam-se sobre os restos orgânicos formando uma cobertura mineral que favorece sua preservação durante a fossilização. É comum em ossos e conchas de ambientes de caverna, onde a água é rica em minerais como o carbonato de cálcio.
  • Concreção: é quando durante o processo de decomposição dos organismos, são liberados compostos que desencadeiam reações químicas que ocasionam a precipitação de substâncias que envolvem os restos orgânicos em nódulos. Os fósseis da Bacia do Araripe são um exemplo de concreção; os peixes ao serem decompostos nos fundos de lagos liberavam amônia que facilitava a formação de carbonato de cálcio ao redor de seus restos, preservando sua forma dentro de nódulos que hoje são encontrados e coletados.  
Concreção carbonática com peixe da Bacia do Araripe, do Cretáceo do Nordeste. A preservação excepcional permite a observação de detalhes do animal. Foto por Heitor Francischini, 2020

É possível também que, durante a litificação, o sedimento que envolve o material biogênico preserve a forma do resto mesmo que este seja totalmente destruído. O tipo de fóssil resultante desse processo é chamado de molde. Vale a pena mencionar que, apesar de também serem vestígios de um organismo, os moldes não podem ser classificados como icnofósseis, já que não foram produzidos por um organismo em vida. Os principais tipos de moldes são:

  • Molde Interno: ocorre quando o espaço interno do fóssil é preenchido por sedimento, preservando suas feições. Moldes de conchas e carapaças de invertebrados são os exemplos mais comuns, mas este tipo de preservação também pode ocorrer com cavidades cranianas de vertebrados, por exemplo.
  • Molde Externo: ocorre quando a parte externa do organismo é coberto por sedimento que preserva suas feições externas. Novamente, os exemplos mais comuns incluem os invertebrados e plantas.
  • Contramolde: ocorre quando a cavidade móldica (espaço vazio no sedimento, que era ocupado pelo resto do organismo antes de sua dissolução) é preenchida, preservando tanto as feições externas quanto internas do organismo. Desta forma, uma “réplica” do organismo é produzida.

Fósseis são encontrados em todos os lugares do planeta, desde os áridos desertos da Mongólia até as geladas terras da Antártica. Em conjunto, são capazes de reconstituir os cenários da biodiversidade existente em cada período geológico e demonstrar sua modificação ao longo do tempo. Microfósseis como conodontes, ostracodes e foraminíferos são utilizados na indústria petrolífera, possuindo além de seu valor científico um valor econômico expressivo. É através dos fósseis que podemos reconstruir seres que tanto nos encantam, como dinossauros, pterossauros, mamutes e tigres dente-de-sabre. São, portanto, o objeto de fascínio que faz da Paleontologia uma ciência tão cativante.

Materiais de Referência

BENTON, Michael J.; HARPER, David. A. T. Introduction to Paleobiology and the Fossil Record. 1.ed. Nova Jersey: Wiley-Blackwell, 2013. 608 p.

CASSAB, Rita de Cassia Tardin. Objetivos e Princípios In: CARVALHO, Ismar de Souza (Org.). Paleontologia – Volume 1: Conceitos e Métodos. 3.ed. Rio de Janeiro: Editora Interciência, 2010. 756 p.

VEGA, C. S.; DIAS, E. V.; RODRIGUES, S. C. Fósseis e Processos de Fossilização. In: SOARES, M.B.(Org.). A paleontologia na sala de aula. Ribeirão Preto: Sociedade Brasileira de Paleontologia, 2015. p. 90-102.

Sobre o autor

Lucca Cunha é licenciando em Geografia na UFRGS e atua como bolsista de iniciação à popularização da ciência no programa Ciência na Sociedade, Ciência na Escola da Propesq. Também atua como voluntário no Laboratório de Paleovertebrados do Departamento de Paleontologia e Estratigrafia do Instituto de Geociências da UFRGS.

Sobre o autor

Heitor Francischini é licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de São Carlos. Mestre em Geociências (Área de Concentração: Paleontologia; 2014) e Doutor em Ciências (Área de Concentração: Paleontologia; 2018) pelo PPGGeo-UFRGS. Durante o doutorado realizou período sanduíche no New Mexico Museum of Natural History and Science (em Albuquerque, EUA) e, durante a graduação, realizou intercâmbio na Universidad de la Republica (em Montevidéu, Uruguai). Atualmente é Professor Adjunto A da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, ministrando as disciplinas Paleontologia Aplicada à Biologia, Paleontologia II e Paleontologia de Vertebrados para os cursos de Ciências Biológicas (Licenciatura e Bacharelado) e Geologia. Possui experiência com os seguintes temas: Paleontologia, Paleobiologia e Paleoicnologia, com ênfase no registro de vertebrados continentais do Paleozoico e Mesozoico, principais temas de sua pesquisa. É membro da Sociedade Brasileira de Paleontologia